Nestes dias entre Natal e Ano Novo, provavelmente todas as galerias já estão de recesso, assim a 6a.feira chuvosa é um bom dia para visitar alguns dos espaços institucionais no Rio de Janeiro, que estão abertos e, sem a concorrência da praia e com as compras de Natal encerradas, recebem um bom número de visitantes.
No Centro Cultural da Caixa, duas exposições bem interessantes.
A primeira é sobre "O barroco no popular e o popular no barroco", curadoria de Cristina Ávila e Gisele Catel. Eu imaginava que após a mega-exposição-cenográfica da Bia Lessa sobre o Barroco, em 2000, nas comemorações dos 500 anos do descobrimento, ninguém iria tentar mais nada sobre o assunto por um bom tempo. Realmente já é um bom tempo, 8 anos, e esta exposição é concisa e mostra ao que veio, indo para uma vertente mais analítica do que espetacular. Seu enfoque é sobre a influência do barroco, "arma ideal da colonização para a dominação de novas terras e novos povos", que se voltou "contra os opressores: os artistas mestiços usando a liberdade do barroco para o 'fazer, ver e sentir' permitiu a brancos, índios, negros e mestiços do Brasil modificar o gosto, o estilo e a vida que adotamos e vivemos ainda hoje."
A outra exposição da Caixa Cultural é "Identidade do Artista", que mostra o projeto de arte postal (mail-art) feito nos anos 1970 pelo Ângelo de Aquino, com fichas encaminhadas pelo correio e respondidas, também pelo correio, por 75 artistas do mundo inteiro. Ver na sala da exposição as fichas ampliadas e manuseáveis, ao lado dos originais em vitrines, para mim é muito bom, é gratificante. Eu mesmo trabalhei com arte postal nos anos 1970 e 1980 (estive na XVI Bienal de SP, em 1981, na seção de Arte Postal, com curadoria do Walter Zanini). Certamente que para os jovens artistas de hoje, geração pós-internet, a arte postal deve soar como algo anacrônico como o impressionismo (pior ainda, pois sem valor de mercado...), e afinal se na Bienal de 1981 o conceitual ainda imperava, a Bienal de 1985, com a Grande Tela, consagrou o retorno da Pintura e a morte do conceito. Pelo que me lembro a arte postal continuou a ser feita até o final dos anos 1980; talvez alguns heróicos resistentes tenham continuado pelos anos 1990, mas o advento e crescimento da internet, por volta de 1995, modificou totalmente o perfil dos meios de comunicacão. Com isso, os conceitos que sustentavam a arte postal evoluíram para as novas midias e muitos se tornaram arte do mainstream: a criação de redes, a democratização das artes, fazer uma arte do quotidiano (herança da arte povera), a dessacralização do papel do artista (qualquer um com acesso a uma máquina de xerox e uma agência dos correios, em qualquer país, pode divulgar sua idéia para públicos nos mais diversos lugares do mundo e, melhor ainda, com eles dialogar, formar redes de comunicação, discutir assuntos que não são cobertos pela midia careta ou pelo circuito de artes). Estes conceitos são muito atuais, e se hoje a arte postal pode ser vista como uma curiosidade pelos visitantes da exposição do projeto do Ângelo de Aquino, a sua herança não se perdeu.
Depois, no Paço Imperial, a retrospectiva do Burle Marx. Eu gosto do Burle Marx, ele é um dos pilares do modernismo no Brasil, sua obra em paisagismo foi inovadora e marcará as gerações vindouras, como foi o Niemeyer na arquitetura. Gosto também da pintura, das gravuras e desenhos, das cerâmicas e até dos panneaux, as pinturas em tecido. Gosto dele em geral, já que eu sou tão ligado no modernismo, moro em uma utopia modernista (Brasília), gosto dele como um dos ícones do modernismo, o "visual Burle Marx" é um arquétipo dos anos 1960, a mais perfeita tradução, em pintura, do zeitgeist dos anos 1950-60-70. É um excelente colorista, e impressiona ver como os jardins são projetados como pinturas (vistos de cima), o que é a ideologia do modernismo, a escala umana utilizada em Brasília e que marca até hoje o paisagismo.
(Por que não os jardins para serem vistos "de dentro"? na minha juventude no final dos anos 1970, quando se reagia ao modernismo eà bossa-nova como "velhos", "americanizados", tínhamos uma brincadeira: se você fosse um jardim, qual seria? as pessoas respondiam o do Parque Lage, a Floresta da Tijuca... e quando alguém falava que seria o Aterro do Flamengo, era vaiado)
A exposição está linda, bem montada, a cronologia é precisa e preciosa, a sala dos panneaux é belíssima, a tapeçaria gigantesca é uma epopéia, o jardim interno é demais... Mas vendo a exposição como um todo, vejo a obra total de um artista que hoje estaraia na categoria de multimeios; só que me detendo na pintura (que é o que mais me interessa), vejo que: um grande colorista; esteticamente muita beleza, muita técnica, sensibilidade; mas em algumas telas parece que "falta sair de dentro" um Picasso, mesmo um Portinari, ou seja, "falta" a força de um Mestre. O que não diminui absolutamente a força do conjunto da obra.
Galeria Progetti, uma instalação e desenhos da Sandra Cinto e pinturas da Lívia Flores. As "pinturas" da Lícia Flores são na verdade colagens de papel de presente dos anos 1980, com padrões cinéticos, brilhantes, repetitivos, sobre telas. O resultado é muito bonito. Os amassados e rasgados do papel de presente dá uma característica realemnte pictórica às "pinturas", e, o que é um motivo meu para gostra mais, o padrão multiplica losangos em prata e azuis.
A instalação da Sandra Cinto desenha ondas de mar sobre uma parede e sobre reproduções monocromáticas, em tamanhos variados, de uma mesma pintura (A balsa da Medusa, de Géricault), com excelente resultado.
No CCBB, rever, com mais calma pois minha primeira visita foi meio corrida, a exposição Nova Arte Nova. E, com tempo, visitar o sanctum sanctorum, a seção de livros raros da Biblioteca do CCBB. Colocar luvas, ter um simpático guardião ao lado, e poder folhear precisidades como o Coisa mais linda, o livro em edição limitada, da Beatriz Milhazes; um livro de desenhos (série de desenhos de um cão), obra única da Gabriela Machado; um livro também cópia única do Zílio, de 1977, onde, entre desenhos e fotografias extremamente conceituais, características do trabalho do artista na época, aparece um desenho esquemático sobre do "homem concretista excitado", diagrama que o Zílio mostra em pintura na exposição dele este ano na Anita Schwartz; e o livro do Nuno Ramos com um poema gravado em folhas de vidro. Além disso, o livro de fotos do Helmut Newmann, com sua base do Phillip Strack, o livro de mesa que é a própria mesa de livro. Mais não vi pois não teria mais tempo, mas é um lugar para voltar.
sexta-feira, 26 de dezembro de 2008
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