quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Rio, 4 exposições

1- Na Galeria Mercedes Viegas, uma exposição com obras do artista Amílcar de Castro, duas dezenas de obras entre esculturas e pinturas, uma boa exposição, bem representativa da obra do artista.
É interessante ver as pinturas do Amílcar logo após ter visto as pinturas negras da Célia Euvaldo; tem a ver, o fazer deve ser muito semelhante; mas o resultado é bem diferente, os artistas enfocam problemas diferentes em suas pinturas:  as pinturas do artista mineiro, paradoxalmente para um escultor, são bem bidimensionais, leves, enquanto que as pinturas negras da artista paulista tem um peso, elas querem sair do seu suporte, mesmo dialogando com ele; estas, esculturas, relevos, dançam, se movem com a luz, que enfatiza as diferenças de textura, de espessura, de profundidade.
Embora as pinturas do Amílcar sejam muito bonitas, o forte de sua obra é mesmo sua escultura. Com formas simples, dobraduras precisas, repetições e rupturas, simplicidade e coerência, pesos e levezas, o artista constrói uma obra que vai se mostrando aos poucos ao espectador, que se revela aos poucos, recatada e desafiadora, como a paisagem mineira; obra que é perfeita tradução do concretismo, dos trabalhos gráficos do artista com o Jornal do Brasil nos áureos tempos, tradução do período desenvolvimentista, e que vem até nós, no terceiro milênio, renovada, atualizada, contemporânea...
E uma lembrança, a exposição Arte para Crianças, no CCBB/BSB, no início deste ano, com curadoria do Evandro Salles, que apresentou, em uma sala, 140 pequenas esculturas do Amilcar, com uma enorme ao fundo, inesquecível!

2- Aquarelas de José Alberto Nemer, na Galeria Anna Maria Niemeyer. O artista, também mineiro, com suas aquarelas, ao meu ver busca expandir os conceitos de aquarela. São aquarelas grandes, as maiores com 1,30 x 2m, o que já contraria a noção comum de um meio que se presta a trabalhos pequenos, delicados, imediatos. O perfeccionismo na técnica do artista chega a nos fazer duvidar de que se trata de aquarela, aquele meio que não aceita erro, que não permite consertos; pois as manchas de tinta se sobrepõem, se derramam, se entrecruzam; as tonalidades se combinam e se mesclam, para logo depois fluírem isoladamente; e fazer esta tinta líquida, mercurial e rebelde, seguir por grandes áreas de papel, obediente ao desejo e visão do artista, é um feito e tanto!
Além desta minha análise, afinal uma análise de quem também já brigou com a aquarela e entende as dificuldades que Nemer superou com maestria, mesmo os olhos de um leigo se encantarão pela beleza e força dos trabalhos. Vi duas exposições anteriores do artista, no CCBB em 2000 e depois em 2003, no Instituto Moreira Salles, e vejo um crescimento e amadurecimento na técnica e nos resultados.
3- Na Galeria Silvia Cintra, Divagações de um Fugu delirante, exposição de fotos de Miguel Rio Branco. O fugu é o peixe japones, equivalente ao que conhecemos como baiacu, e que, apesar de extremamente venenoso, é uma iguaria apreciada na culinária nipônica, e na verdade é o pretexto para o fotógrafo mostrar suas lindas imagens sobre Tóquio, onde expôs em 2004.
Em 2007, Miguel volta ao Japão para realizar seu segundo projeto no país, fotografando a capital japonesa enquanto o japonês Daido Moryama fazia o mesmo com a cidade de São Paulo, para uma grande exposição no Museu de Arte Contemporânea de Tóquio, em 2008, e parte da qual está sendo exposta na Galeria carioca. As fotos são excelentes, e ao serem apresentadas em conjuntos elas se agigantam, as cores saltam e se sobressaem em relação às formas, são quase abstratas em sua concretude de fotografias, são instalações, imagens de um caleidoscópio que apresenta a estranheza (para nós, claro) da cultura japonesa.
Sobre o Fugu, uma boa referência na Wikipedia, onde podemos ler sobre os cuidados para a retirada das partes venenosas do peixe, o treinamento e a prova pelos quais passam os chefs licenciados pelo Governo Japonês a preparar e servir o Fugu (na prova final o aluno come o Fugu que ele mesmo preparou, e a reprovação é a morte, o que é muito curioso mas, pensando bem, muito correto), e ainda que o prato mais popular é o tessa, um sashimi de Fugu, cortado em fatias tão finas que os desenhos do prato são vistos sob a carne crua; os pratos de tessa são decorados na forma de uma flor do crisântemo, que é, na cultura japonesa, um símbolo da morte...


4- Visões, exposição de José Tannuri, na Galeria Hugo Rocha. Um plus em minha visita à exposição foi vê-la na companhia do artista, podendo discutir com ele o trabalho, buscando um entendimento mais completo. José Tannuri utiliza o jornal como matéria prima para seu trabalho, mas nesta série que está exposta o jornal entra como meio, não como informação. Um pouco como o trabalho do Luciano Figueiredo, que utiliza as palavras e imagens do jornal como um elemento visual a mais na composição de um espaço pictórico, e diferente portanto do trabalho, por exemplo, do Antonio Manuel, onde a informação do jornal é tratada graficamente mas é a informação que o trabalho veicula.
Assim, Tannuri monta as folhas de jornal em grandes chassis; recobre-as com uma fina camada de tinta amarela, o que protege o frágil jornal e também dilui um pouco as palavras/imagens, coerente com sua proposta; sobre esta "tela", grava, com matrizes de serigrafia, imagens de "telas de arame", o que é outra camada de distanciamento; ao final pintando em silhueta partes de corpo feminino, pernas, pés, curvas; em algumas delas formas circulares como que vazadas, em diálogo com o vazado das redes; um diálogo de sobreposições, de cheio-vazio, de mostrar-se/cobrir-se, uma tensão erótica que aparece muito explícita em uma obra onde uma pequena tela de video, engastada em um suporte de jornal/tela de arame, mostra repetidamente uma dança adolescente e palavras/imagens de prostitutas.

Veja registros dos vernissages no site do fotógrafo Odir Almeida, http://www.soartecontemporanea.com/

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