segunda-feira, 28 de setembro de 2009

James Kudo, Telúrico


Na Galeria Laura Marsiaj, a exposição Telúrico, do artista James Kudo, mostra 11 obras, sendo 4 pinturas,  5 desenhos e 2 objetos. A curadoria é do Marcelo Campos, que escreve um belo texto de apresentação. No Anexo, fotografias de Magnus Vaena.
O título Telúrico (do dicionário, "telúrico - te.lú.ri.co - adj (teluri+ico2) 1 Relativo ou pertencente à Terra.") nos remete à natureza, a um cheiro de terra molhada, de folhas caídas e de cogumelos brotando, para mim um clima até meio hippie, anos 1960, ou mesmo século XIX, Thoreau...

Mas o artista utiliza de forma bem diferente os elementos ligados à terra, à natureza: pássaros, cogumelos, troncos de árvores, água... com uma estética que está longe de ser hippie ou back-to-basics, pelo contrário, é uma estética totalmente contemporânea, do terceiro milênio, que tem parentesco com os comics, com uma visão da cultura de massa e de apropriação e transfiguração do kitsch. Uma visão bem pessoal e lírica, e ao mesmo tempo universal e contemporânea. Sim, e com uma técnica perfeita, perfeccionista, um desenho que é desenho, bom desenho, pintura que é pintura da boa, e objetos impecavelmente construídos.

Os pássaros dos desenhos não voam, são cabeças e bicos de pássaros, delicadamente desenhados, que brotam, como cogumelos, de galhos de árvores; ou são silhuetas apenas, como recortadas de lambris imitando madeira (na veradade, pinturas em guache mimetizando os veios da madeira, não da madeira mas de seu simulacro em plástico, em fórmica, em contact).
Os cogumelos que brotam nos desenhos e nas pinturas, que se transformam em balões de comics, flutuantes, em padrões/cores diferenciados, em frente a uma floresta de sombras de árvores; os mesmos cogumelos, em um objeto, brotam, feitos em mármore, de um tronco (de madeira "de verdade"?), pintado em padrão camuflado: o fugaz e perecível cogumelo, feito no material eterno das esculturas; em um tronco que, com a pintura, se transforma em uma representação em plástico de um tronco, onde o camuflado é também uma representação das folhas de outono.

A água, toda a umidade de uma floresta, se junta em caudalosas quedas domesticadas em um represa; mas a imagem é um ícone, a represa tem a textura de madeira, e a água é um azul-celeste chapado, imobilizado; ou manchas de azul, delimitadas em retas e ângulos, em tinta bem espessa, eu sou uma pintura; ou círculos de laca branca envolvendo, estáticos, uma casa e uma torre também em puro branco. Ou estes círculos não são água e sim nuvens, castelos nas nuvens?
Telúrico.
Telúrico, sim, mas uma natureza mutante, onde nada é o que parece, onde os objetos sempre apontam ou mimetizam outros. Onde nada é extático, tudo muda, brota ou decai, inspira ou expira, flui, brilha, e mesmo morto se renova em outro ser.

É como ler Metamorfoses, de Ovídio, e viajar em um tempo onde os deuses se transformavam em cisnes, em chuvas de ouro, e os mortais podiam se transmudar em árvores ou ser transformados, por castigo, em cervos ou em cortiça... mas ao mesmo tempo este tempo não é lá, em um passado longínquo, e sim aqui e agora, o mundo mágico ainda existe e está ao alcance de quem o busca, de quem o merece, de quem o recria, como James Kudo.

Mais:
Registros do vernissage nas fotos de Odir Almeida

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