sábado, 19 de setembro de 2009

Um vinho, um ícone, nas asas da Varig


Minha primeira viagem à Europa, acompanhado de uma amiga mais velha, mais rica e mais sofisticada que eu, que já havia morado uns anos em Londres.
Antes do avião da Varig levantar vôo, o comandante chama pelo som da cabine o nome de minha amiga, pede que ela se identifique aos comissários de bordo.
“Srta. X? Há um telex da Diretoria com uma ordem para um up-grade da sra. para a Primeira Classe, queira nos acompanhar.”
Eu devo ter lançado meu olhar de medo e de tristeza, eu tinha pouco mais de 20 anos.
Ela responde, firme, “estou na companhia de meu amigo, ele pode ir também?”
Ante a negativa, optou por ficarmos juntos, e o comissário finaliza com algo sobre “um tratamento de primeira classe”.
Algum tempo depois, é servido o jantar, e na bandeja de minha amiga veio uma garrafinha de 375 ml de um vinho. Tinto. Francês.
Eu devo ter lançado novamente meu olhar de medo e de tristeza.
O comissário me pergunta se também aceito um vinho, respondo (é claro) que sim, e ganho também uma garrafinha igual, de um precioso e desconhecido líquido, com uma identificação que ficou marcada como a fogo em minhas retinas: Châteauneuf-du-Pape. Apenas isso, eu não sabia o que sei hoje, que deveria gravar também as letras menores, que há Châteauneuf-du-Pape e Châteauneuf-du-Pape, que há os quatro algarismos da safra que também podem fazer toda a diferença.
Bebemos nossas garrafinhas, também não me lembro qual era o prato principal, nada, só me lembro daquela garrafinha, do nome mágico, do líquido “quente” (melhor: não-gelado, para quem bebia apenas cerveja, caipirinha...), rubro escuro, vivo.
E depois, terminada a refeição, recolhidas as bandejas, quando o comissário veio até mim e me cobrou o vinho, 10 dólares. Poderia pagar também em moeda brasileira (cruzeiros? Cruzados? Alguma coisa novos?), mas aí eu preferi pagar com as verdinhas fazendo pose de rico e viajado, apesar de minha confusão. O vinho de minha amiga não foi cobrado.
Depois disso, as palavras mágicas Châteauneuf-du-Pape passaram a ser para mim um ícone de finesse, de uma vida rica e de prazeres...

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