sábado, 30 de janeiro de 2010

Bye bye, Brasília

A primeira vez que vim a Brasília, com meus pais, a cidade ainda estava em construção, um canteiro de obras. Para meu pai, um homem culto que não conseguiu estudar a arquitetura de que tanto gostava, mas que projetou e construiu auto-didaticamente algumas casas modernistas na pequena São Luiz do Maranhão, a visita era como a realização de um sonho. Para mim, um deslumbramento, o porte das obras me parecia (e era) gigantesco, enormes movimentos de terraplanagem, tratores e escavadeiras (dizia-se que vindos do Sul em aviões) cavavam buracos de 30m de altura no meio do que era um enorme barro vermelho, no Marco Zero, o centro do que em breve seria a Rodoviária; a Esplanada ainda com os andaimes e o esqueleto dos prédios do Ministérios; a escultura ôca do que seria a Catedral; a tão-longe Ermida que para mim era mesmo o lugar onde esse Dom Bosco havia sonhado com a Capital do Terceiro Milênio.
Alguns prédios já totalmente prontos, e lindos: o Palácio da Alvorada, com a maravilhosa parede em ouro que falava do nascer do sol, da esperança em um futuro grandioso para o Brasil e os brasileiros, para as crianças como eu...
Ficamos hospedados no Brasilia Palace Hotel, o único hotel em funcionamento na época, também projeto do Niemeyer, e não esqueço os sinuosos corredores de acesso aos quartos, com milhares de copos de vidro incrustados na parede de concreto, permitindo a iluminação e protegendo do vento frio do Lago Paranoá (quando o Hotel pegou fogo, em 1978, tive pesadelos imaginando os copos trincando com o calor das chamas). O Catetinho, uma obra-prima rústica do gênio da arquitetura, proporções perfeitas, simplicidade e ecologia antes de existir o conceito de ecologia. A enorme lua cheia sobre o Paranoá, o brilho feito maior pela escuridão do céu ainda não poluído por iluminação urbana.
Depois, voltei muitas vezes a Brasília.
Em 1967, meus pais foram (entre centenas de pessoas, claro) à posse do Costa e Silva como Presidente da República. Viajamos do Rio até Brasília em um fusquinha café-com-leite e nunca uma estrada me pareceu tão reta. Na noite da festa da posse, no Itamaraty (eu não fui, pois era apenas um adolescente), chovia torrencialmente, e esta cidade que sempre está associada à secura, mostra que sabe como chover, como vim a ver muito tempo depois.
Em 1971, vim com minhas irmãs para uns dias na casa de meus tios, pioneiros de Brasília. Meus primos eram ainda crianças de colo; ao chegar na cidade, em pleno tempo seco, fiquei rouco e depois totalmente afônico, uma reação alérgica que nada deixa a desejar ao meu desconforto atual com a secura. Meus tios ainda moravam em um apartamento na 102 Sul, e o terreno do Lago Sul, onde depois eles construíram a casa onde moram até hoje, ainda era um matagal distante (sem a Ponte das Garças, a Primeira Ponte, que só foi inaugurada em 1974). O unico "point" na cidade era o Gilberto Salomão, e duas unicas "boites" (na época escrevia-se assim,em francês), a Kako e a Shalako, ficavam uma ao lado da outra, totalmente iguais, depois que você entrava em uma delas não sabia mais em qual delas estava.
Em 1974 passei um mês inteiro em Brasília, trabalhando no prédio do Ministério da Fazenda, e morando com meus tios. Era verão. Eu em Brasília e o Rio bombando, com a praia, estava apaixonado e gastava milhões em moeda da época com telefonemas intermináveis para o Rio. Conheci a Galeria de Arte do Oscar Seraphico, um pioneiro, e com ele comprei meu primeiro Gerchman, uma gravura amarela com uma estrela prateada e a palavra SOS. No final da estadia, uma véspera de Carnaval, enfrentei o maior engarrafamento de aeroporto de minha vida (pior que nos apagões aéreos de 2006), e pela primeira vez aprendi a odiar os homenzinhos de terno com distintivos de Deputado ou Senador que furavam todas as filas.
Depois outras vindas, sempre rápidas, a trabalho, às vezes esticando finais de semana na casa ou na fazenda dos meus tios. Meus primos crescem, se casam, e meu sobrinhos-netos são outra nova geração que leva para o futuro as gotas de sangue dos Aguiar. Nos anos 1980 ouvi falar pela primeira vez em um bairro novo, o Sudoeste, uma expansão criada a partir do estudo do Lúcio Costa, "Brasília Revisitada".
Até que, em 2006, a proposta de trabalho é boa, o assunto (um projeto em tecnologia de Inteligência Artificial) tem apelo, a vontade de mudar, de novas experiências, de morar em uma cidade modernista, é forte.
E cheguei em Brasília, para ficar talvez 6 meses, talvez 1 ano no máximo; acabei ficando quase 4 anos. Vim apenas com uma pequena mala, e na chegada já uma prova da hospitalidade "nordestina" dos moradores da cidade: um amigo, colega de trabalho, fez a questão de me buscar no aeroporto, mesmo contra meus protestos; nos horários de almoço os colegas disputavam quem iria me levar para almoçar, eu ainda sem carro em uma cidade que depende de carro para tudo, e com um restaurante no trabalho com uma comida intragável.
Semanas na casa de meus tios, depois alugo, neste novo bairro ("setor", como eles chamam), no Sudoeste, um pequeno apartamento, um conjugado, o que em Brasília se chama "uma kit", herança do termo quitinete da Copacabana dos anos 1960. Com o tempo, conheço melhor a geografia afetiva da cidade, e me mudo para um apart-hotel na beira do Lago, com um visual que me lembra o mar, mas nem tanto o mar do Rio e sim outro mar, a praia do Ôlho d'Água de uma longínqua São Luiz que só existe em minhas memórias.
Hoje, quando começo a contar não mais em meses ou dias e sim em horas o tempo que ainda passarei aqui, chega o tempo para reflexão.
Brasília, ame ou odeie. Ou, como a sequencia dos 5-D da piada que esqueci: deslumbramento, decepção... até chegar a depressão ou desepero...
Posso dizer que, se não cheguei a amar esta cidade com um amor incondicional, gostei e gosto muito dela. No geral é muito bonita, bem preservada; esqueça as pobres arquiteturas pós-modernistas das Superquadras novas, do Pontão e do Lakeside e as construções mal feitas das cidades satélites e pense na boa arquitetura que às vezes nos surpreende em um detalhe; esqueça as violações, os estupros ao Plano e pense onde estes princípios são mantidos, na Superquadra Sul 308, na Esplanada; esqueça as invasões (não tão visíveis como no Rio e São Paulo, mas existentes, discretas, mesmo ao longo da via de acesso ao Palácio da Alvorada) e pense nas áreas verdes, nos espaços livres, no Paranoá democrático onde se anda de lancha ou jet-sky mas também se pesca a linha nas margens nem todas privatizadas ou urbanizadas.
Esqueça a desconfiança dos estranhos ou vizinhos que em geral não respondem ao seu "bom-dia" (muitos mesmo se assustam), e pense que, uma vez rompido o gelo, os estranhos se transformam em amigos de infância, prestativos, acolhedores. Pense na segurança que faz com que se possa namorar tranquilamente em um carro estacionado à noite na orla do Lago sem nenhuma preocupação em sofrer violência por parte de assaltantes ou da própria polícia.
Esqueça a desordem urbana, esqueça as propostas de um trem (para mim, um bonde) de superfície no gramado central da Esplanada, a licença para apartamentos de morradia no Eixo Monumental, a proposta da Praça da Cidadania e outras. Leia o texto original do Lúcio Costa na exposição de motivos do Plano Piloto, ou leia um livro como Case: Lucio Costa Brasilia's Superquadra, que analisa a proposta e a realidade do viver em conceitos modernistas, e pense em como as quatro escalas propostas por Lucio Costa - monumental, gregária, residencial e bucólica  - ainda se mantêm, resistindo a ameaças.
Pensando nisto tudo, e mais, é uma cidade muito boa para se viver, para se crescer. Fiz investimentos aqui, imobiliários e afetivos, e todos eles me trouxeram ótimo retorno.
Atingi meus objetivos. Se o tal projeto de Inteligência Artificial não atingiu totalmente seus objetivos, isso se deveu, a meu ver, à hubris dos seus condutores no nível mais político; sim, e esta política suja, sem opção ética, que vemos hoje e que contamina todo o aparelho estatal, embora floresça aqui, não é daqui; daqui é, sim, o populismo e o clientelismo de um Roriz e de um Arruda que fez e fazem tudo para destruir a harmonia do Plano Piloto.
Volto para o Rio, e volto para o que ao meu ver faz falta em Brasília: uma vida cultural intensa, prerrogativa de metrópoles como Rio, São Paulo, NYC, Paris, Berlin... Brasília não é uma metrópole, na verdade esta não é sua proposta. Embora Brasília tenha alguma vida noturna e bons restaurantes (o atendimento sempre muito atencioso e pouco eficiente, eu acho), alguns focos de eventos culturais (CCBB e Caixa Cultural), a fome de cultura não faz parte do dia-a-dia dos moradores, e os eventos culturais são poucos, mal divulgados, em temporadas curtas e caros ou inacessíveis.
Volto para o Rio, para dar continuidade a meus novos projetos, menos com Tecnologia e muito mais com Arte, meu principal interesse.
Mas construí uma Brasília em meu coração, que me acompanhará até o fim dos meus dias.



Leia mais:

Texto sobre o uso dos pilotis em Brasília
Texto sobre o "viver moderno" nos blocos das superquadras
Outro texto sobre "a invenção das superquadras" em contraposição ao viver em condomínios
Mas a melhor referência sobre as Superquadras, para mim, é o livro Case: Lucio Costa Brasilia's Superquadra, editado por Fares el-Dahdah, e que pode ser comprado na Amazon por menos de US$20, uma leitura essencial para o entendimento teórico do "viver em uma Cidade Modernista"

Créditos:
As fotos atuais são minhas, das centenas de imagens que fiz sobre Brasília, uma cidade tão fotogênica.
As fotos da construção de Brasília são do Arquivo Público do DF e foram digitalizadas por Augusto Areal, que tem dois bons sites com informações muito interessantes sobre a construção de Brasília e Brasília atual, que muito me ajudaram a entender a cidade com a visão prática de quem nela viveu e vive

domingo, 24 de janeiro de 2010

O Museu Nacional de Brasília e a exposição Entreséculos

A exposição Entreséculos, com o acervo artístico das instituições públicas sediadas em Brasília, tem curadoria de Wagner Berja e Xico Chaves, e fica até o final de janeiro, no Museu Nacional (Conjunto Cultural da República), em Brasília.
Ao meu ver é mais uma tentativa de ocupar bem o interior do prédio do Museu, que foi projetado pelo Niemeyer como um espaço monumental, sem nenhuma consideração prática com o que significa "mostrar obras de arte". As tentativas mais bem sucedidas, pelo que pude ver neste tempo em que acompanho as exposições no Museu, foram as que ocupam o mezanino; ou as que ocupam "as beiras" da cúpula, com painéis acompanhando mais ou menos as paredes circulares, deixando o espaço central, com seu pé direito gigantesco, para alguma projeção ou instalação "de efeito", ou mesmo um vazio. A rampa externa que liga o salão principal ao mezanino, e que possibilita uma vista linda da Esplanada dos Ministérios, raramente é usada, e nas últimas exposições está sendo radicalmente fechada.
Para não parecer que sou implicante, li no jornal de Brasília entrevista dos curadores com queixas, bem polidas, sobre esta dificuldade, citando inclusive o carpete cinza, que não pode ser modificado. Sim, eu vi o efeito do carpete contra a linda escultura Língua, do Tunga: as duas enormes peças onduladas de madeira repousam sobre pequenos Budas de bronze; isto eu sei, pois já vi a escultura antes, no Museu de Arte de Brasília; nesta montagem, os Budas simplesmente não são vistos, desaparecem entre os pelos do maldito carpete cinza.
Sem contar com a crítica de sempre: o que o Niemeyer tem contra árvores? Por que o Museu e a Biblioteca foram implantados em um enorme terreno todo acimentado, sem uma grama, um arbusto, uma sombra, apenas três ridículos espelhos d'água? Outra crítica, mas esta eu sei a resposta: por que não fazer um estacionamento subterrâneo? já que uma das laterais do terreno (a da via S2) fica a uns 4 metros abaixo do nível principal (logo perto, este desnível é utilizado para garagens subterrâneas em todos os prédios dos Ministérios, projetos do mesmo Niemeyer). Assim, o Conjunto Cultural da República oferece para estacionamento apenas as laterais das ruas internas de acesso aos prédios, insuficiente para os visitantes nos dias de semana.
Mas a minha resposta a esta pergunta surgiu no domingo passado, um domingo de sol, quando visitei a exposição, e vi que, para minha surpresa, o Museu estava cheio. Muito cheio. Famílias, crianças, casais, adolescentes, idosos... Olhando melhor o público, vi que é um público que, em grande maioria, não veio de carro; não tive dificuldade nenhuma para estacionar. Não vir de carro, em Brasília, tem uma significação diferente de em cidades como Rio ou São Paulo, com transporte urbano razoável; significa que este público veio de longe e enfrentou um transporte, ônibus ou metrô, super-precário, com horários que nos finais de semana são muito mais irregulares; saltou na Rodoviária e foi, em massa, visitar o Museu, talvez fazendo hora para uma ida ao Shopping (o Conjunto Nacional, outra pequena caminhada a partir da Rodoviária). Sim, este é o público do Niemeyer, e ele não precisa de vaga em estacionamento. Este é o público do Arruda e dos demais políticos de Brasília, e ele vai gostar do tal trem urbano que estão planejando para circular bem no canteiro central da Esplanada, destruindo a harmonia projetada pelo Lúcio Costa e por um Niemeyer com 50 anos a menos. Pareço elitista? talvez ranzinza. Mas eu gostei de ver o Museu cheio, muito melhor do que vê-lo vazio.
A exposição é bem interessante, e se propõe a reunir obras do acervo de instituições públicas sediadas em Brasília, como forma de ampliar o acesso do público a essas obras, ou talvez para mascarar o fato de que o Museu e a Biblioteca são cascas vazias, lindos prédios sem acervos. Engraçado, acho eu, é que a divulgação a apresenta como uma ideia do próprio Lula: "...nem sempre o público tem acesso a estas obras. Foi pensando nisso que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sugeriu que se montasse uma mega-exposição para exibir, ao povo brasileiro, os destaques destes acervos". Bom, de metalúrgico a Presidente e agora Curador; ou talvez um reflexo do culto à personalidade que vivemos e que vimos, por exemplo, com o Grande Timoneiro Mao.
A partir desta diretriz, e considerando as dificuldades já citadas, os curadores Wagner Berja e Xico Chaves fizeram um bom trabalho; a exposição flui bem, por núcleos ou ilhas: “Montamos várias ilhas, sem seguir uma linha do tempo linear. Partimos das afinidades para revelar coisas que muitas vezes passam despercebidas”, explica Barja.
Algumas obras que não estão presentes, por não fazerem parte de acervos no DF, mas que seriam importantes na ilha (um manto do Bispo do Rosário, um Profeta do Aleijadinho), são substituídas por imagens impressas em computador, o que achei um recurso fraco, até por que a qualidade da imagem é péssima.
O melhor de tudo, certamente, são as obras do Museu de Arte de Brasília. O MAB, criado em 1985, tem um acervo que vem sido constituído desde a década de 1960, a partir de doações, contrapartidas e prêmios de aquisições, e assim conseguiu um impressionante acervo, com obras de, entre outros, Beatriz Milhazes, Daniel Senise, Iberê Camargo, Lygia Pape, Nuno Ramos, Waltércio Caldas... O prédio do MAB é totalmente inadequado (escrevi aqui no blog sobre isso após minha primeira visita a esse Museu), e as obras foram transferidas, felizmente, para a reserva técnica do Museu Nacional, mas permanece mal explicada uma tentativa de fusão das duas instituições, que na prática significaria apenas a extinção do MAB, ou seja, um espaço a menos (e um espaço que, embora precário, necessitando de reforma e adequação, é bem simpático).
Outros acervos importantes, presentes na exposição, são o do Banco Central, constituído, principalmente, por obras recebidas, nos anos 1970, como pagamento de dívidas de instituições financeiras em liquidação, o da Caixa Econômica, o do Ministério de Relações Exteriores (Itamaraty) e o da Universidade de Brasília (UnB). E é interessante saber, também pela divulgação, que o acervo do Museu Nacional já se iniciou com uma doação, feita pela Polícia Federal, com aproximadamente 200 peças, "obras de alguns dos maiores nomes do Modernismo no Brasil – Portinari, Volpi, Tarsila do Amaral  etc." Não entendo muito bem por que a Polícia Federal teria quadros modernistas em suas paredes, mas tudo bem. E ainda da divulgação: "desde então, o museu vem montando uma coleção feita com outras doações, principalmente de representações diplomáticas". É aí que mora o perigo. Há uma política de acervo, um foco, um conceito que norteie a formação de uma coleção? ou é um pragmatismo do tipo "a cavalo dado não se olham os dentes". O Museu Nacional não deveria focar em arte brasileira? então por que receber doações de representações diplomáticas? Enfim, posso mais uma vez estar sendo ranzinza.

Mais no blog sobre o Museu de Arte de Brasília e o Museu Nacional, clique aqui e aqui

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Narrativas privadas, pinturas de Fábio Baroli


Estava na internet, navegando sem compromisso, vendo sites ligados a artes (bom, claro que no meio tempo uns sites pornôs, também), quando aquelas imagens me pegaram pelo pé, me derrubaram, me nocautearam; eu queria ver mais; pesquisei pelo nome do artista, descobri um blog e um flickr, mas sem endereço de email para contato. Pinturas. Um artista de Brasília. Fábio Baroli.


As primeiras imagens que vi, no site do Olheiro da Arte, uma boa vitrine para jovens artistas, foram as que me nocautearam. O breve currículo diz apenas: "É bacharelando do décimo semestre em Artes Plásticas pelo Instituto de Artes (IdA) da Universidade de Brasília (UnB)."

Depois, no blog e no flickr, pude ver mais imagens. Pinturas, retratos, grandes dimensões, de um realismo até meio retrô, virtuosísticas, mas nas quais se sente forte conceituação como base. A questão do conceito sustentando a pintura fica mais clara ao ver que o artista é o mentor de algumas performances que vi pelos jornais aqui em Brasília: intervenção na Catedral com uma luz cor de rosa; Telúrico, polêmica escultura para espaço público no campus da UnB.

Como tenho sorte, o artista participa de um Salão juntamente com uma artista amiga minha, faz-se o contato, primeiro por email e depois, ao vivo, na abertura de uma coletiva em Brasilia; uma exposição heterogênea, mas onde os trabalhos dele se destacam. Enfim vejo "ao vivo" as pinturas, continuo gostando delas, e gosto mais ainda do artista, um jovem motivado e antenado, que escolheu como meio de expressão a velha e já tantas vezes anunciada como morta, a pintura; um artista que está participando de muitas exposições e salões pelo Brasil afora, com premiações, e que é uma aposta para o futuro.

A série Narrativas Privadas se desdobra em pequenos trípticos. Uma pintura de nus que elimina a sensualidade da carne; a carne e o azulejo tem o mesmo tratamento pictórico; e o azulejo é na verdade mais sensual que a carne; como se o artista "dissecasse" os corpos, ao invés de apenas "expô-los". Mas não é um tratamento frio, distanciado; pelo contrário, a pintura é espessa, exuberante, pinceladas, espátulas, óleo; a cor é muito variada, a pele tem tonalidades de carne, de ocre, de marfim, de verde, marrons, azuis; mas a voluptuosidade é da tinta, da pintura, não das pessoas; estas estão tranquilas tomando seus banhos, os sexos e as celulites, as dobras de gorduras, as varizes, os cabelos do corpo, à mostra; como se vistas, em movimento (dado pelo enquadramento dos trípticos), observadas por alguém escondido, vistas através de um basculante, o voyeur-espectador; e o erotismo está todo nele, no pintor, no espectador, que ao ver a cena erotiza não só a carne mas também os azulejos, as gotas d'água, as torneiras de metal gasto, os aparelhos de gilete e os box de plástico.

Erotização feita não pelo tema (nus banais), e sim através da pintura; a marca do pincel do artista é a marca que o olhar do voyeur-espectador busca, e extrai de uma cena de quotidiano, de homens e mulheres de meia idade em uma tarefa corriqueira, um banho talvez meio corrido para não perder o horário do trabalho, ou cansado depois de um dia de luta; não o banho de quem se prepara para o amor ou de quem, saciado, se limpa dos fluidos e secreções de uma cópula; não; apenas isso: um prosaico banho.

Não são jovens, os corpos não são os malhados que a midia vende como os desejáveis, eles talvez não conheçam mais a intensidade do desejo já há tanto tempo perdido na rotina dos dias. Não são Madonas, não são Jesus. Mas o artista os retira de seus banheiros anônimos, e nos faz desejá-los, e nos faz, a nós, iguais a eles, desejados; como objetos de um desejo perverso polimórfico, como objetos de uma sensualidade pagã, como objetos de desejo para o voyer-artista.

Engraçado, Narrativas Privadas não é um trabalho erótico, carnal; ao optar pelo erotismo do voyeur, pelo fetichismo, eles se tornam menos crus, podem participar de exposições, não tem a pulsação de outros trabalhos do Fábio, que são explícitos e tem o vigor de um erotismo rebelde, uma série erótica da qual mesmo o artista fala com certo cuidado. São as Apropriações Textuais: uma versão sangrenta, menstruada, da Origem do Mundo, de Courbet; um enorme empalado com o rosto do artista e genitais bem desenhados, que tem de um Cristo clássico, de Goya (Esto es Peor) e de Vlad Tepes; Decapto, onde (como nos Caravaggio) a cabeça decaptada é um auto-retrato - mas o jovem carrasco está nu e seu vigor erótico é explícito.



Outros trabalhos do Fábio também tem esta forte carga de erotismo, que aparece até mesmo nos trabalhos de cunho conceitual. Telúrico é um obelisco que é uma árvore fálica em pleno campus da UnB; a rejeição ao trabalho acabou por derrubá-lo, o que irônicamente não desfez a semelhança, apenas destruíu a ereção.

Da mesma forma, ao pintar com luz a Catedral de Brasilia o concreto se torna carne, vibrante em cor de rosa, uma gigantesca vulva multifacetada. Talvez estes trabalhos mais explícitos sejam muito chocantes (pois Brasília, embora Corte, é uma Província) e estejam guardados, protegidos, para serem mostrados aos poucos, como véus que se abrem. Mas ao "domesticar" o erotismo através do fetiche, do voyeur, das Narrativas Privadas, Fábio consegue, sem prejuízo da qualidade, "se infiltrar" e  "nocautear" o espectador desavisado, como eu naquela noite em que navegava na internet.  



Veja mais trabalhos do artista em seu Blog e em seu Flickr, com mais fotos da construção e da derrubada de Telúrico, e a repercussão na imprensa.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Um prato para comer frio

Dois filmes que vi recentemente abordam o tema da vingança; porém, como não podia deixar de ser em se tratando de cineastas tão diferentes, a abordagem e as conclusões são bem diversas. São eles Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds, 2009), do Quentin Tarantino; e Abraços Partidos (Los Abrazos Rotos, 2009), do Pedro Almodóvar.

Bastardos Inglórios tem tudo de violento, irônico, politicamente incorreto, a marca registrada do Tarantino. Um filme de "E se?": e o que aconteceria se as vítimas se vingassem, punindo o carrasco em seus próprios termos, com violência desumana, desmedida? A partir desta frase está definido o roteiro; uma inversão nos papéis; agora os nazistas são enfrentados em seu próprio campo (a França dominada) por um esquadrão assassino que os massacra com o mesmo sadismo que, sabemos, lemos, vimos em milhares de cenas de cinema, os nazistas massacraram os judeus. Um "olho por olho e dente por dente" com todos os detalhes escatológicos. Nos primeiros dez minutos de filme (quando as cenas ainda são meio arrastadas, embora violentas) ainda consigo pensar coisas como "mas se o agredido utiliza a linguagem do agressor ele não está incorporando o mal que existe no agressor e se transformando, ele, no próprio agressor?" ou "como combater o mal sem se igualar ao mal?"; mas a trama segue, se acelera, se abre e se encaixa em trilhas de um enredo perfeitamente construído, e esqueço a vã filosofia para embarcar no mar de sangue, de vingança, de escalpos, que termina por reescrever a História. Catarse, cinemão, seja lá o que for, mas o filme funciona.

Já Abraços Partidos, como não podia deixar de ser, apresenta a vingança como um leitmotiv dentro de um pano de fundo de complexas relações amorosas e existenciais, onde a arte (especificamente, o cinema) tem papel da maior importância. O filho quer se vingar do pai, homófobo, filmando um documentário que o desmascarará. O marido traído descobre a traição através da investigação de cenas filmadas; e a sua maior vingança é truncar o filme, o fruto da traição. E para o amante que tudo perdeu, terminar o filme, mesmo às cegas, é se vingar da tragédia, da morte, da escuridão. Entre ameaças e risadas, sexo casual, paixões avassaladoras e amores silenciosos, relações pai-filho, de amizade, de amor/ódio, e entre cenários lindíssimos e cenas grandiosas (a queda de Lena na escada tem a força de uma Scarlet escada abaixo em ...E o Vento Levou), Almodóvar constrói outra pequena obra-prima. E diz ao que veio: apenas a Arte tem o poder de transcender a morte, de vingá-la, de vencer.

Embora, para mim, a melhor representação de vingança ainda está na música imortal de Lupicínio Rodrigues ("Eu gostei tanto / tanto quando me contaram...").

Ainda:

Site oficial do Almodóvar

The Quentin Tarantino Archives

Linda Batista canta Vingança, uma versão maravilhosa 

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Viciado em Ópera


O que faz um viciado em ópera quando as duas cidades onde mora nos últimos tempos estão a zero em termos de programação operística? Dizem que a "opera-addiction" traz síndrome de abstinência com efeitos quase tão pesados como os da "heroin-addiction".
Brasília, além das eventuais "óperas para o povo", grátis, na Esplanada, tem uma sessão semanal de DVDs de ópera tradicionais do Met, em um dos cinemas da Academia de Tenis; é pouco, para uma capital que talvez tenha um público potencial, pelo menos nas Embaixadas. E o Rio, mesmo antes do Theatro Municipal entrar nesta reforma em ritmo de obra de igreja, já estava sem programação ou com uma programação raquítica. É pouco. Muito pouco.
O que fazer? Sonhar com Callas e acordar ouvindo Claudia Netto no rádio da vizinha? (quem é Claudia Netto?)
Uma coisa que tenho feito é matar meu vício a conta-gotas: ver trechos de óperas pelo Youtube. Internet é o máximo, e o Youtube tem tudo, ou quase tudo. E a partir destes meus prazeres solitários, trechos de máximo de 10 minutos na tela do notebok, sonho com a grandiosidade, a transcendência, o prazer sinestésico que somente a montagem ao vivo de uma ópera consegue me dar (sem drogas proibidas, claro).
Assim, me fixei em 3 óperas, das quais vejo pedaços, à exaustão. Esqueci Verdi, Mozart, Rossini. Ouço  Philip GlassAkhnaten e Satyagraha) e John Adams (Nixon in China). As duas primeiras fazem parte da Trilogia de óperas do compositor americano Philip Glass que abordam homens que mudaram o  mundo em que viveram a partir do poder de suas ideias (a terceira ópera da Trilogia é Einstein on the Beach, igualmente linda, mas que por algum motivo subjetivo não entrou em minha compulsão neste período).


Nixon in China, ópera de 1987, também fala sobre algo que mudou o mundo, a visita do Presidente dos USA Richard Nixon à China, em 1972 (descrita pelo próprio Nixon como "uma semana que mudou o mundo"), que marcou o processo de entrada daquele país na comunidade (e no comércio) internacional, possibilitando que, com a queda do Muro de Berlin e da URSS, a polarização USA x URSS dos anos de Guerra Fria tenha se deslocado para USA x China. A ópera do compositor John Adams, também americano, tem foco nos personagens do Presidente e da Primeira Dama Pat Nixon, do Comandante Mao e sua esposa Jiang Qing (líder da Gang dos Quatro, que detinham o poder e posteriormente seriam derrubados e condenados)e os dois assessores, Henry Kissinger e Chou En-lai. Nas primeiras cenas, a chegada da comitiva de Nixon (com um avião Air Force 1 no cenário), seguida pela visita a lugares da China rural, uma apresentação de uma peça de propaganda política (é a época do livro vermelho de Mao e da Revolução Cultural chinesa, de triste memória) com uma aparição espetacular de Jiang Qing cantando o que acho o ponto alto da ópera, a ária I am the Wife of Mao Zedong; uma aparição surpresa do próprio Mao; e a última noite na China, quando os personagens dançam um foxtrot enquanto avaliam a semana, seus passados e futuros políticos. A música é minimalista e ao mesmo tempo espetacular, e mesmo o que seriam temas "chineses" não caem no folclórico; o cenário na maior parte do tempo dominado por um gigantesco retrato de Mao que remete ao pop e ao Warhol; e a ópera toda tem um clima pop e irônico.


O Faraó Akhnaten foi o primeiro monoteísta da história, e a substituição, durante seu reinado no Egito, da religião politeísta pelo monoteísmo, foi uma das causas de sua violenta deposição. A ópera, escrita por Philip Glass em 1983, descreve a ascenção, o reinado e a queda do Faraó; e os duetos deste com sua esposa, a rainha Nefertiti, são os momentos altos da partitura, que abandona um pouco o "minimalismo pesado" de outras obras do compositor (inclusive das outras óperas da Trilogia) para chegar a harmonias que, embora sem deixar o minimalismo, são mais acessíveis.







Em Satyagraha (1980), o assunto é Mahatma Ghandi e o desenvolvimento de sua prática de protestos não-violentos como arma política; o título da ópera é uma palavra em sânscrito que significa "força verdadeira". Cada um dos atos é dominado por uma figura histórica, que não canta, mas desempenha papel de catalisador da ação: o poeta indiano Rabindranath Tagore, o escritor russo Leon Tolstoy e o líder americano Martin Luther King Jr. A ação é monumental, o tempo é lento, repetitivo; e a música minimalista, e lindíssima, envolve e domina o espectador como um mantra.







Com estes pedaços de óperas comecei, nos últimos meses de 2009, uma nova série de pinturas. Algumas delas estão aqui, "auto-retratos como Akhnaten"; nestas últimas aparecem, no cenário, outros elementos que utilizo em minhas pinturas: a vanitas do Philippe de Champaigne, as carpas. Não procuro nestas pequenas pinturas a monumentalidade da ópera, e sim um clima de fantástico, lisérgico, a musicalidade das cores, um certo kitsch, um tom nostálgico de um mundo perdido, pois o Akhnaten da ópera poderia muito bem ser eu, vestido de egípcio nos bailes do Theatro Municipal de um Carnaval onde eu ainda era uma criança.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Relembrando um amigo (João Luiz Perigault)


Éramos amigos inseparáveis, pelo menos por um breve período. Eternos, como costumam ser as amizades e as crenças quando somos jovens e temos o mundo à nossa frente.
O ano era 1973. Com a morte do Ivan Serpa, alguns alunos migraram para as aulas com o Bruno Tausz, no mesmo Centro de Pesquisa de Arte, em Ipanema, uma casa no número 48 da Rua Paul Redfern: um terreno pequeno e a casa se espalhava para o alto, para os 4 andares onde arte & vida se misturavam.
O segundo andar era o local dos cursos. Até o final de 1972 o Ivan vinha do Méier para suas aulas e a sala ficava cheia: alunos antigos (Emil Forman, Gerald Thomas, Paulo Gomes Garcez, Luiz Ferreira...), alunos novos, as "madames" (que tinham arte por hobbie, adoravam o Ivan e compravam seus quadros e às vezes também compravam trabalhos dos jovens alunos), passantes (vinham assistir uma ou duas aulas e depois sumiam, talvez com medo das broncas do Ivan)...
Nós víamos a obra dos pintores nos livros que o Ivan trazia ou nos "audio-visuais" que o Bruno projetava (slides, com a trilha sonora da querida Jenny, depois sonoplasta de tantas novelas na TVGlobo). Tão diferente de hoje, quando a arte internacional chega por exposições, pela internet, no momento mesmo em que é feita; naquela época a maneira de conhecer a arte dos grandes centros era uma viagem internacional (caríssimas) ou através dos livros de arte que pessoas antenadas como o Ivan recebiam em primeira mão através da D.Vanna, da Livraria Leonardo da Vinci.
Com a morte do Ivan, o espaço se reorientou em torno das aulas do Bruno, que tinha uma didática excelente; embora fosse controvertido como artista, era um líder, com muito carisma e extremamente envolvido com o ensino.
Assim conheci os alunos do Bruno e logo éramos 3 amigos, inseparáveis: eu, Perigault e S. Um trio improvável, mas que estava sempre junto, viajando, vendo exposições, discutindo arte, fazendo planos para o futuro, rindo, rindo muito...
Eu, artista misto de executivo da nascente tecnologia da informação, tentando ser um hippie mas curtindo muito o dinheiro que minha carreira me dava.
S., uma linda mulher nos seus 20 e poucos anos, charmosa, sexy, gargalhada farta, vinda de uma estadia em Londres e buscando conhecer arte, ser artista talvez? trabalhar em alguma atividade ligada a arte, o que conseguiu, pois se firmou no meio das artes como uma marchand das mais conceituadas.
João Luiz Perigault, alguns anos mais novo, meio wierd, super-inteligente, um romântico, introspectivo, um dark ou gótico ("avant la lettre", só se falaria nestes movimentos anos depois), detentor de uma mitologia toda pessoal que ia toda para suas pinturas excessivas, barrocas... Sempre de preto e com uma jaqueta mesmo em pleno verão do Rio, grande consumidor de livros de arte e de rock (ganhei dele o meu primeiro LP do Lou Reed, ninguém esquece), freguês de carteirinha da Livraria Leonardo e da Modern Sound.
No apartamento no Bairro Peixoto, o pai, uma influência marcante, muito inteligente, foi José Perigault, um dos fundadores e diretores do Ibope (na fase pré-Montenegro da instituição); morreu em 1977 em um acidente na Via Dutra e hoje é nome de rua em Jacarepaguá. A mãe, D.Marisa Villela Perigault, uma juíza competente e uma pessoa doce e gentil; e a irmã mais nova, Márcia, na época uma garota que devia achar estranho o rock sempre nas alturas no quarto do irmão. Ah sim, e um cachorro, o Caifás (que o Perigault pronunciava escandindo: "Cai-e-faz").
Em nossas discussões existenciais que viravam noites, ele tinha sempre uma dúvida, profunda, intensa: "Não sei se devo ou não pintar em tela". Eu e S. ríamos do que nos parecia uma dúvida menor, ingênua, diante das dúvidas sobre o mundo, sobre dinheiro/ideal, sobre ter ou não talento, sobre a imortalidade da alma; mas esta era a dúvida que estava submersa no mundo das artes quando se dizia que a pintura morrera, e que foi respondida com o grito, na década seguinte, da Geração 80, da Transvanguarda. Só hoje entendo que a questão que ele colocava de forma quase infantil era então a verdadeira questão da arte; o que eu e S. na época, talvez nos achando mais velhos e mais experientes, não víamos.
Perigault fez uma exposição individual no mesmo Centro de Pesquisa de Arte, ainda nos anos 1970. Pelo que me lembro, em uma época de arte conceitual, as suas pinturas góticas, épicas, com forte influência do H.R.Giger, foram mal recebidas; devo ter ainda o recorte de jornal de uma crítica negativa. Completamente fora de seu tempo. Nos dias de hoje certamente o trabalho do Perigault seria melhor compreendido, é o que penso quando vejo artistas como o ingles Glenn Brown (um dos YBA, Young British Artists), o belga Stephan Balleux, entre outros. Pintura minuciosa, feita com prazer, transpirando carne e erotismo, apropriação/referências à história da arte, elementos de ficção-científica (impressionante como os enormes quadros da série de Sci-fi do pintor inglês me lembram as telas do Perigault!), está tudo lá, em telas que hoje foram esquecidas.
Muitas gargalhadas depois, fomos cada um para seu caminho.
Nunca mais o vi, nunca mais ouvi falar dele. Por uma notícia de jornal muito tempo depois, soube da morte da mãe; no obituário de D.Marisa, ele é qualificado de "artista plástico" e a irmã, Márcia, que conheci vagamente como irmã mais nova de meu amigo, citada como médica, conceituada, morando em São Paulo.
Recentemente, pesquisando na internet, soube que o João Luiz Perigault morreu em 2000 ou 2001; morreu novo, sem completar 46 anos; apenas a data da morte, sem detalhes; nem mesmo a qualificação como artista. Não sei o que foi feito do trabalho, se as pinturas se conservaram; tenho uma, óleo sobre papel cartão; um icônico torso, fantástico, esfolado, dissecado, em tons de azuis e lilases. Apenas isso, e as memórias.
Ao querido J.L.P., onde estiver, em um Walhalla qualquer, vendo as Valquirias e os guerreiros do seu universo fantástico, o meu abraço.

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