Terminando de ler Leite Derramado, o novo livro do Chico Buarque. Gostei muito, ao meu ver é o melhor dos quatro romances do escritor e compositor (Estorvo, de 1991; Benjamin, 1995; Budapeste, 2003).
Os mesmos jogos de espelhos, de aparências, coisas que ao mesmo tempo são e não são, a memória, a sua persistência e fugacidade. Mas ao meu ver neste romance a escrita sai mais redonda; nos anteriores a precoupação com a forma, os jogos com a linguagem, embora corretos, como que diziam ao leitor a todo o momento: é um livro do Chico Buarque, sagaz, inteligente, cheio de significados, witty; a todo o momento se podia ver os olhos verdes do autor atrás da voz do narrador; como se os personagens fossem personas de um escritor que é como que um conhecido de todos nós pela exposição na midia por tanto tempo.
Já em Leite Derramado os personagens adquirem vida própria, e apesar de o leitor até poder "achar" pontos em comum entre autor e narrador (famílias quatrocentonas etc.), Eulálio d'Assumpção, ancião centenário, morrendo ou renascendo, com suas contradições, sua falta ou excesso de memória, seus preconceitos, sua ingenuidade e imaturidade que o persegue pela vida, com tudo isso, é um ser que cresce e toma vida a partir das páginas do livro. Matilde, a mulher que desapareceu sem uma foto, sem deixar um traço de sua presença, enigmática, misteriosa como uma Capitu, puta, santa, mártir, louca, suicida? também vive o seu mistério se torna um desafio para o leitor, como o é para o seu Eulálio.
Um bom livro.
malga | Santa Helena
Há 4 dias
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