São Paulo, noite de abertura da SP-arte, o Pavilhão Bienal no Ibirapuera cheio, o espumante Salton servido sem parcimônia. Entre os milhares de pessoas que passam pelos stands, um sorriso tímido e irônico, um olhar forte, roupa preta, uma camiseta com estampa de caveira, uma vanitas. É ela, a cantora? pergunto. Sim.
Vou até ela, que já se afasta do stand, falo seu nome, meio envergonhado pois já não sou mais um adolescente para agir como um fã, pergunto se posso tirar uma foto com meu celular, uma foto dela comigo, pedindo desculpas por agir como um adolescente fã enamorado.
Ela sorri e com a voz muito rouca diz que sem problemas, que já está acostumada, eu me enrolo todo na operação do celular para tirar a foto, não é o nervosismo do encontro, é que eu sou meio atolado com estas coisas de tecnologia, digo, ela, paciente diz que também é (claro que é uma mentira piedosa), finalmente consigo tirar a foto que minutos depois está no Facebook, para gáudio e inveja das centenas de amigos: eu e ela.
Agradeço, gaguejo, pois não é bem isso o que eu queria dizer, apenas “obrigado”, queria dizer que eu a conheço muito, desde o primeiro LP quando ela era muito magrinha e com cabelos encaracolados, desde quando ela fez a tatuagem com a figura de um cometa, desde quando eu pulava com S. no Canecão ao som da guitarra que ela tocava com o charme de tirar a mecha do cabelo negro que sempre voltava a cobrir sua testa, queria dizer mais, que minha avó e a avó dela trocavam receitas quando grávidas de nossas mães, em outra cidade, outro Universo, outro século, outra dimensão de tempo e de hiperespaço, queria dizer tanta coisa dentro do “muito obrigado” que falo com um sorriso e um beijo em cada lado da face, tão cariocas (os paulistas dão apenas um beijo, as faces direitas). E ela desaparece entre os corredores sinuosos do Pavilhão Bienel lotado de gente.
No Hotel, procuro no iPod e lá está, entre as 5673 músicas armazenadas, Fullgás, Marina Lima, o LP inteiro. Adormeço ouvindo as guitarras e a voz rouca que embalaram nossa tardia adolescência, um tempo quando tínhamos um futuro, e este futuro era o momento presente eternizado na voz rouca que chega a mim não mais nos sulcos do vinil e sim de um chip, da voz rouca que está além de qualquer tecnologia, eterna como eternos são os mitos e os amores de adolescência.
quinta-feira, 29 de abril de 2010
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