sábado, 12 de dezembro de 2009

Wanda Pimentel: "Linhas"


O trabalho de Wanda Pimentel certamente é um ícone da pintura brasileira do final dos anos 1960-70. Com rigor formal e liberdade temática, uma estética que unia o pop ao concretismo, a abstração à figuração, o quotidiano ao metafísico, com temas anos 1970 (crítica ao consumo) e temas precursores das décadas futuras (o papel da mulher), as pinturas da série Envolvimento são inesquecíveis. E incrivelmente atuais.
Acho que a última exposição que vi da artista foi a da série Animais, em 2004, no MAM-Rio, que achei interessante, correta, mas na verdade não me empolgou muito, talvez pela força da lembrança dos trabalhos da série Envolvimento; assim, fiquei muito curioso por ver a exposição Linhas, com trabalhos novos da artista, na Galeria Anita Schwartz. Não só para ver a evolução do trabalho da artista, como também para ver como um trabalho basicamente de pintura, séria, concisa, sem o espetacular, iria ocupar o espaço de catedral do grande salão da Galeria.
Ocupou, e ocupou bem, com pinturas, só pinturas, em paletas nada espetaculares, terras, marrons, negros; em tamanhos sensatos, de 60x60 a nenhuma enormidade; sem virtuosismos de montagem. A pintura em si, enfileirada, na altura do olhar do espectador; ao centro, uma instalação com sequencias de caixas contendo serpentes, dialoga com as Linhas das pinturas, mais que isso, mostra que as linhas são vivas, podem ser traçadas com rigor ou livres, serpenteando, aprisionadas em caixas com outras linhas, espelhos, e estão vivas, mesmo dormindo, as linhas são como serpentes encantadas que pulsam da superfície das pinturas. Nas pinturas da artista, nada é apenas o que nos parece; as superfícies chapadas em marrom ou negro são vibrantes, as linhas retas oscilam, o rigor é calculado e intuitivo, as escadas saem do plano e levam além dele, a um além transcendental ou são simplesmente escadas de pedreiro, usadas por alguma equipe de limpeza para alcançar um teto que está muito acima das pinturas mas que na verdade está dentro delas.
Ainda, em uma instalação, o giz desenha as linhas e as escadas nas paredes de uma pequena sala da Galeria; como um esboço para as pinturas, como um ambiente que será magicamente compactado nos quadrados de 60x60cm, como um exercício, um aquecimento, uma preparação da artista para as pinturas e também do espectador para as pinturas que, enfileiradas na sala monumental, não se diminuem, não se apequenam, pelo contrário: elas dominam a sala monumental e a transformam em um suporte neutro para elas, para ela: a pintura, vitoriosa.
Ainda, na Galeria, uma mostra do acervo, com obras ineditas de Arthur Omar, Vergara, Ivens Machado, Nuno Ramos e Rodrigo Andrade. Bons trabalhos, todos eles, mas impossível deixar de destacar os totens do Ivens, ao ar livre, com sua imponência e precariedade de material de construção, cimento e vergalhões, uma metáfora do ser humano e do construir/destruir que é a vida.

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